Fallout é a mais nova adaptação de um universo icônico dos videogames, refletindo uma tendência crescente em Hollywood de transformar jogos em produções de sucesso. Este RPG renomado oferece um material ideal para adaptação, cumprindo muitos dos requisitos para uma transição bem-sucedida ao live-action. Ambientado em um mundo pós-apocalíptico, Fallout se inspira em narrativas de zumbis, história alternativa e uma wasteland no estilo Mad Max, elementos que têm atraído grande público nos últimos anos. A produção ainda se destaca por seu tom ácido e ultra-violento, alinhando-se com a marca da Amazon Prime Video, conhecida por séries como The Boys e Invencível. Com temas sobre guerra nuclear e bombas atômicas, cada vez mais relevantes no cenário político atual, a série também ganha relevância com o lançamento de Oppenheimer.
Além de estar bem posicionada para uma adaptação de sucesso, a série conta com a participação dos co-criadores de Westworld, Jonathan Nolan (produtor e diretor) e Lisa Joy (produtora), apesar de os showrunners serem os relativamente desconhecidos Graham Wagner e Geneva Robertson-Dworet. A equipe criativa optou por uma abordagem ousada e apropriada, não adaptando diretamente nenhum dos jogos, mas criando uma história que se passa dentro do universo canônico dos jogos. A primeira temporada, com oito episódios, apresenta uma narrativa independente, com liberdade criativa total. A trama segue Lucy (Ella Purnell), uma jovem criada em um abrigo nuclear da Vault-Tec, que sai em busca de seu pai (Kyle MacLachlan) após seu sequestro. Em sua jornada, Lucy descobre um mundo pós-apocalíptico perigoso e cheio de monstros, onde encontra o soldado Maximus (Aaron Moten) e um caçador de recompensas morto-vivo conhecido como The Ghoul (Walton Goggins).
Embora não seja uma adaptação direta, os roteiristas capturam com precisão o tom e o cenário dos jogos. Visualmente, a série apresenta um pós-apocalipse nuclear que mistura a cultura americana dos anos 50 com o modernismo atompunk, oferecendo uma estética retrofuturista que combina velho-oeste, art déco e um complexo militar-industrial típico das paranoias da Guerra Fria e do medo da aniquilação nuclear. A atenção aos detalhes em figurinos, armas, maquiagens e arquitetura, bem como na trilha sonora, é tecnicamente impecável, criando um universo diegético atemporal. Mais importante que o design de produção, é a forma como os roteiristas aproveitam a diversidade temática e visual, explorando “fases” e missões secundárias que atravessam o western, a ficção científica, o militarismo, o horror e, principalmente, a sátira.
Fallout é, acima de tudo, uma narrativa nômade sobre a exploração de um mundo desolado, repleto de elementos provocativos, ridículos e espetaculares, algo que a adaptação captura na aventura de Lucy e seus companheiros. Às vezes, isso pode fragmentar a trama principal e causar uma sensação de desorganização narrativa devido aos numerosos núcleos e reviravoltas. No entanto, a série apresenta de forma eficaz um cenário de aventura surreal com comentários ácidos sobre capitalismo, corporativismo, controle, crise de energia e, claro, guerra. Os melhores momentos da série envolvem sua ficção especulativa, que é mais irônica do que densa, apesar do terço final da temporada ser um pouco explicativo demais. Sem dúvida, esta é mais uma adaptação de sucesso de um universo dos games, fiel à essência engenhosa e satírica do material original, ao mesmo tempo em que é criativa e canonicamente original, abraçando a linguagem narrativa dos jogos e exibindo uma forte personalidade visual e temática em seu pós-apocalipse bizarro.